A empresa vencedora da licitação dos 600 quilômetros da hidrovia do tramo sul do Rio Paraguai vai ter de investir R$ 59 milhões na dragagem constante do curso d’água para garantir que as embarcações trafeguem o ano todo, mesmo no período de seca. Essa determinação faz parte da proposta de concessão elaborada pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e do Ministério de Portos e Aeroportos para evitar que comboios sejam obrigados a reduzir drasticamente a quantidade de carga transportada ou mesmo interromper o fluxo, como já ocorreu em anos anteriores.
No ano passado, o Correio do Estado divulgou que as condições de tráfego estavam prejudicadas pela seca, com o transporte de cargas reduzido e restrito por cerca de quatro meses. Em agosto, o nível do rio em Ladário estava em apenas 19 centímetros, com média de 2,2 cm de recuo por dia. Em 2023, quando o rio chegou à máxima de 4,24 m, o transporte foi possível durante quase 10 meses. Em 2021, o nível ficou 60 cm abaixo de zero.
Para evitar essas situações, estudos técnicos da licitação apontam que deve ser garantido calado mínimo de, pelo menos, 2 m (6,6 pés) no período de estiagem e de 3 m (10 pés) no período de cheia, respeitado o comboio-tipo e a zona de referência hidrológica, bem como o dimensionamento adequado das intervenções de engenharia “para viabilizar a navegação segura, econômica e sustentável durante 365 dias por ano”.
A intenção é possibilitar comboios de até 290 m de comprimento do conjunto de empurrador e barcaças. Cada grupo terá 16 barcaças com capacidade para 3 mil toneladas, totalizando 48 mil toneladas transportadas. Com as intervenções, a proposta é garantir o transporte de 25 a 30 milhões de toneladas por ano a partir de 2029. Nos dois últimos anos, foram transportadas cerca de 10 milhões de toneladas.
Para viabilizar esse tráfego, a empresa ganhadora da licitação deverá realizar campanhas de dragagem, monitoramento hidrológico, implantação e manutenção de auxílios à navegação e diversos serviços relacionados para garantir o calado operacional para os usuários em todo período, “salvo nos períodos de estiagem, quando deverá ofertar um calado de 2 m”.
Ainda, as metas contratuais não se baseiam exclusivamente na profundidade de dragagem, mas “na oferta contínua de calado operacional adequado aos usuários da hidrovia. Anos com maior disponibilidade hídrica podem demandar volumes reduzidos de dragagem de manutenção, enquanto anos de estiagens severas exigirão campanhas mais intensas para assegurar o calado contratual”.
OUTORGA
Os documentos sobre a outorga do tramo sul do Rio Paraguai, que vai de Corumbá até a foz do Rio Apa, em Porto Murtinho, com 590 km, e inclui 10 km do Canal do Tamengo, em Corumbá, afirmam que a concessionária deverá ser obrigatoriamente uma empresa de dragagem. Se for consórcio, deter, no mínimo, 15% do capital para fazer a limpeza, a desobstrução, a remoção, o derrocamento ou a escavação de material do fundo do rio, incluindo dragagem de manutenção e derrocamento subaquático.
No documento consta que “o motivo dessas exigências se deve ao fato de que os desembolsos a serem realizados, pela concessionária, para obras e serviços de dragagem e para os serviços diretamente associados, conforme previstos no EVTEA do empreendimento, ao longo do período de vigência do contrato, correspondem a cerca de 48% do Opex [investimentos para operacionalização]”.
Essa exigência é para evitar que uma eventual concessionária alheia a um grupo econômico de empresa de dragagem não consiga contratar os serviços necessários em virtude de o “mercado de serviços de dragagem reconhecidamente ter abrangência geográfica mundial e ser concentrado em poucos agentes econômicos, o risco de concessão e a existência de diversos serviços diretamente associados à operação de dragagem, como monitoramento hidrológico, levantamentos hidrográficos e auxílios à navegação, julgou-se razoável que a habilitação deste certame exija que o proponente seja uma empresa de dragagem”.
A empresa que participar do certame vai de comprovar experiência na atividade, com comprovação de ter retirado 1.665.000,00 m³ de material, de forma a permitir “aferir um porte de empresa adequado à realização dos serviços e, ao mesmo tempo, não gerar uma restrição excessiva do mercado”.
Assim, “no caso da concessão do tramo sul da hidrovia do Rio Paraguai e do Canal do Tamengo, entende-se que é possível demonstrar a habilitação técnica de uma empresa de dragagem mediante somatório de atestados (de dragagem), pois a execução de sucessivas campanhas de dragagem de manutenção, a qualquer tempo e desde que nas especificações técnicas requeridas, são evidências da qualificação das proponentes”.
ESTUDO
O estudo aponta que na primeira campanha de dragagem do tramo sul deverão ser retirados 670.000 m³ de material do rio. No Canal do Tamengo, o volume estimado foi de 860.000 m³.
Esse cuidado todo na escolha da empresa é justificado em nota técnica, na qual é destacado que “é necessário dar confiabilidade às hidrovias em termos de disponibilidade de águas, ou seja, garantir a perenidade do calado em cada trecho, permitindo o planejamento da logística do setor produtivo e ainda a segurança patrimonial e de navegação aos usuários em todos os níveis: passageiro, tripulação e armador.
Para a concessão da Hidrovia do Rio Paraguai a exigência de qualificação técnica cinge-se à execução de serviços de dragagem, atividade mais relevante no âmbito da concessão, sendo as demais atividades consideradas como de menor complexidade técnica”.
Nas intervenções na infraestrutura hidroviária estão previstos investimentos na ordem de R$ 74,3 milhões nos primeiros cinco anos de concessão, sendo R$ 12,3 milhões ao ano para operacionalização, totalizando R$ 210,8 milhões em 15 anos.
Correio do Estado