Depois do boom de investimentos em celulose nos últimos anos, Mato Grosso do Sul começa a viver um novo fenômeno econômico com a chegada dos investimentos em cítricos, mais especificamente em laranja. Os aportes anunciados para o setor passam de R$ 2 bilhões e são justificados por uma migração dos estados de São Paulo e Paraná para MS.
As unidades da Federação que tradicionalmente são produtoras de laranjas foram acometidas pela doença huanglongbing (HLB), também conhecida como greening dos citros, bactéria que ataca as plantas cítricas e é considerada a mais grave do mundo. A legislação rigorosa de Mato Grosso do Sul para prevenção da doença motivou a migração de investimentos para o Estado.
“Identificamos que existia essa oportunidade de que essa laranja pudesse ser produzida em Mato Grosso do Sul, exatamente em função do greening. Nosso trabalho começou com um decreto de defesa vegetal, para evitar que essa doença entrasse em nosso Estado, e isso já está bastante avançado”, explica o titular da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), Jaime Verruck.
A citricultura tem mais destaque na região leste do Estado e, agora, está se expandindo para a região centro-sul.
“Muitos investidores estão querendo vir para o Estado. O investimento é alto, seria em torno de R$ 100 mil por hectare para implantar o pomar. Até por causa de nossa legislação rígida, com controle, por isso não dá para começar se não tiver capital e know-how na área”, destaca Karla Nadai, coordenadora de Horticultura da Semadesc.
A área ocupada pela citricultura poderá chegar a 15 mil hectares, com o anúncio de novas plantações.
INVESTIMENTOS
Os investimentos já anunciados somam um aporte de R$ 2,1 bilhões em lavouras de cíttricos em MS. Conforme informações do governo do Estado, a Cutrale anunciou um aporte de R$ 500 milhões, destinados ao plantio de 5 mil hectares de laranja na Fazenda Aracoara, propriedade localizada às margens da rodovia BR-060, na divisa de Sidrolândia com Campo Grande.
De acordo com a Cutrale, serão 1,7 milhão de pés de laranja, e a previsão é de que o projeto alcance 30 mil hectares plantados, garantindo o nível de produção que viabilizaria a instalação de uma futura indústria de processamento da laranja em suco.
“Saímos satisfeitos com a receptividade e as portas abertas do Estado. Já estamos com as licenças prontas e vamos começar o projeto, em uma cultura que vai gerar empregos, já que precisa de uma mão de obra maior”, destaca o empresário Jamil Buchalla Filho, da Cutrale.
Já o Grupo Junqueira Rodas começou em abril a implantação de 1,5 mil hectares de laranja em Paranaíba e, ainda, mais 2,5 mil hectares em Naviraí, onde o cultivo de 1 hectare de laranja demanda recursos de R$ 100 mil, ou seja, um total de R$ 400 milhões.
E o mais recente anúncio foi da empresa Cambuhy Agropecuária (Grupo Moreira Salles), que confirmou o investimento de R$ 1,2 bilhão no Estado, que é considerado o “novo cinturão citrícola” do Brasil.
A empresa vai iniciar o plantio de laranja ainda este ano na área que fica em Ribas do Rio Pardo, próximo ao município de Água Clara, com previsão de investir ao longo de quatro anos e meta de colher 8 milhões de caixas da fruta.
“Vamos trazer em torno de 1,2 mil empregos diretos e 2,4 mil indiretos. O que nos trouxe para cá foi o greening, que ameaça 70% da área da citricultura do estado de São Paulo. Houve uma busca por uma nova fronteira, entre Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, o novo ‘cinturão citrícola’. E a gente escolheu essa região”, explica o diretor-geral da Cambuhy Agropecuária, Alexandre Tachibana.
O secretário Jaime Verruck ainda ressalta que o Estado tem, além do ambiente de negócios favorável, espaço e clima para que a cultura se fortifique.
“A citricultura vai bem nas áreas mais arenosas, com menor teor de argila, e isso é importante. Como a laranja está vindo com sistemas de irrigação, nós temos aí uma perspectiva de investimentos altos, mas com alta produtividade. Além de clima, solo e áreas disponíveis, notamos, em especial, a migração de produção de laranja de São Paulo para MS em função da doença do greening”, avalia Verruck.
IMPACTO
Economista do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo destaca que Mato Grosso do Sul é um polo produtor de alimentos, tendo no uso da terra uma de suas maiores vantagens competitivas.
“Com isso, iniciativas produtivas que buscam consolidar novas agroindústrias são sempre bem-vindas para a nossa economia, pois fazem sentido dentro da lógica na qual nos inserimos na economia brasileira e no contexto dos mercados globais”, analisa.
Melo pontua ainda que a expansão da citricultura em MS está alinhada com o objetivo de diversificação da produção local.
“Produzir alimentos e garantir comida na mesa do brasileiro, gerando emprego e renda a partir de parcerias sólidas entre o governo estadual e as entidades do mercado privado, que se traduzirão em um novo salto de desenvolvimento para os municípios contemplados. MS segue avançando em diversos setores, e a citricultura é mais um importante polo de crescimento e desenvolvimento econômico para o nosso estado”, encerra.
O economista Eduardo Matos avalia como um avanço econômico para o Estado, já que a produção de frutas tem um mercado bastante rentável.
“Esse mercado é bastante concentrado hoje na Região Sudeste. Além do que o senso comum indica da produção para o consumo da fruta mesmo, a indústria demanda muito da fruta. A indústria do suco de laranja é bastante diversificada e investe muito em tecnologias, inovações, existem diversos sucos da laranja para finalidades diferentes”, destaca.
Ainda de acordo com o economista, a ideia de Mato Grosso do Sul se consolidar como um “cinturão da citricultura” deverá atrair indústrias para o Estado nos próximos anos.
“Além da produção de fato das frutas, acaba por atrair as indústrias, porque essas indústrias geralmente tendem a se instalar próximo dos locais onde os frutos são produzidos”, finaliza Matos.
O doutor em Administração Leandro Tortosa afirma que, antes, a produção de suco de laranja era majoritariamente da Califórnia (Estados Unidos) e que Mato Grosso do Sul poderá se destacar futuramente na produção do suco.
“Hoje, a cada quatro copos de suco de laranja bebidos no mundo, três são de laranjas brasileiras, antes eram da Califórnia. O Brasil conseguiu sobrepor isso e também teve o ataque do greening, que foi uma doença que atacou laranjais no mundo inteiro, principalmente nos Estados Unidos. Assim como atacou o oeste paulista, e por isso Mato Grosso do Sul está se consolidando na produção de cítricos”.
Correio do Estado